Vai que cola!?
A prepotência de domínio do ser humano pelo seu semelhante é tão antiga quanto a própria história do Homo sapiens. Registros arqueológicos mostram objetos de tortura e encarceramento que os nossos irmãos de épocas passadas eram submetidos por outros irmãos humanos. Uma imposição que só pode ser melhor compreendido como uma projeção de inferioridade de sentimentos do opressor, na qual depositava toda fúria de si no outro, apoiando-se na bengala de um suposto poder que o mesmo fantasiava para domar os seus próprios demônios. Um complexo emaranhado que faz com que o opressor não enxergue a sua própria ignorância, impedindo de conhecer a si como humano, assim como o outro é. Mesmo diante de uma hipótese, que pode ser refutada a qualquer momento, não dá margem para a opressão ser uma das dinâmicas que perpetua até os dias atuais. A opressão deve sempre ser combatida! O cerne da questão encontra-se no indivíduo, pois o mesmo produz ideologias, cultura e sociedade.
Várias formas de opressão dominaram o cenário mundial ao longo dos séculos, tais como: escravidão, ditadura, discriminação de gêneros, entre outros. Em todas as versões de domínio, até a pré-industrialização, sabia-se quem eram os opressores. Um exemplo clássico era a escravidão, pois os escravos tinham como consciência que o sinhô, ou também conhecido como sinhozinho, era o opressor master, ou seja, em muitas vezes havia uma relação direta entre dominador e o dominado. Já na proto-industrialização, até os dias atuais, a sociedade foi fragmentando-se em castas sociais, aumentando o distanciamento entre opressor e oprimido, chegando a tal ponto em que as lutas horizontais entre as castas dinamizam o mercado competitivo em prol do sucesso financeiro. A desverticalização tornou-se uma ciclo de caças as bruxas imaginária que permite a dominação ser atraente para aqueles que lutam pelos restos de recursos. Como dizia Adous Huxley: "A ditadura perfeita terá as aparências da democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão sequer com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e ao divertimento, os escravos terão amor a sua escravidão." E para que isso permaneça, achou-se uma ótima ferramenta de opressão, em outras palavras, a dominação ideológica propagada pelos meios de comunicação, sem que haja violência física para manter a "ordem", a não ser que o recado não seja acatado, nesse caso, o porrete, a bomba e o tiro fazem valer o status quo.
Segundo Thomas Piketty, economista francês que escreveu o livro O capital no século XXI, a taxa de acumulação de renda é maior do que as taxas de crescimento econômico. Em um trabalho de pesquisa econômico em alguns países, principalmente nos desenvolvidos, Piketty conclui que apenas 1% da população mundial detém a maior parte do capital. Um dado alarmante! Resta uma pergunta: Você conhece quem faz parte desse 1%? Veja que antes da industrialização sabia-se quem dominava quem, e hoje? Um abismo se entrepõe sobre nós. E para piorar a situação, a ideologia de dominação dilui-se como senso cultural comum, tornando aceitável certas crenças de que tudo depende de seu esforço para conseguir conquistar seus sonhos. Usam exemplos de pessoas que ascenderam, mas essas estatísticas são irrisórias quando os assuntos são: desigualdades sociais e índice de desenvolvimento humano pelo mundo.
Qual seria a solução para desbancar a dominação do homem pelo homem? A revolução? Depende do que se chama revolução. Olhando a história, tivemos sucessos em alguns casos por direitos civis e trabalhistas, mas parece que as conquistas estão se perdendo em reformas nas sociedades de mercado, com aval da população através de um jogo de marketing no plano midiático que envolve as pessoas com ideologias persuasivas. Em um outro exemplo de grande escala, estão as revoluções que envolvem trocas de sistemas, como aconteceu nas revoluções russa, cubana e chinesa. No final das contas, a teoria socialista de Marx foi deturpada, como acontece até hoje. Acredito que a verdadeira revolução está no indivíduo, principalmente na sua forma de pensar e ver o mundo. Essa, em minha opinião, que pode ser refutada a todo momento, é a revolução mais difícil, pois antes de mais nada, é preciso tirar a opressão de si sobre si. Essa prisão sem muros é construída com mitos e lendas que criamos ao longo de nossa existência. Quebrar verdades absolutas alienantes é o primeiro passo revolucionário. E depois? Não sei. Não tenho resposta para o amanhã. Um passo de cada vez. O que eu percebo na história são revoluções da fúria, sem propostas para o depois. Isso aconteceu na Revolução Francesa quando o povo lutou por seus direitos, até o rei perder a cabeça. E depois? O povo não conquistou a liberdade, pelo contrário, continuou sendo oprimido, perdendo a cabeça na mesma guilhotina do rei. Dostoiévski tinha essa consciência. Quando o mesmo foi acusado de reacionário pelos seus compatriotas, o escritor russo sabia da necessidade de mudança no país, mas Fiódor sabia que a revolução estava vinculada apenas aos interesses pessoais, não era um comum a todos.
O ser humano vive sob o fantasma da opressão, seja pelo semelhante ou por si mesmo. Paradigmas precisam ser revistos, assim como verdades absolutas alienantes necessitam de fiscalização crítica. A história nos ensina onde nós erramos. É tempo de mudanças. Podemos começar na revolução intrapessoal.
Mesmo que venhamos a encontrar a solução para a dominação, o que faremos com a liberdade? Voltar a caverna de Platão não é mais a solução. Vencer o medo de assumir as responsabilidades desalienadas é o nosso próximo passo evolutivo para encontrar a luz fora do cárcere de ilusões, para enfim pensar no comum a todos.
Se não posso mudar o mundo, pelo menos, eu mudo a mim mesmo. Vai que cola!?



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